


Feira do Artesanato
A arte que salva
Por Guilherme Honório
Os Guerreiros das Artes, grupo de artesãos que ocupa a Praça Lions, no bairro da Pajuçara – parte baixa de Maceió – produzem e comercializam suas riquezas culturais. Os produtos chamam a atenção do público, principalmente de turistas, sendo um dos pontos preferidos de quem visita o local, e além do mergulho no azul piscina, do mar de Pajuçara, desejam levar algo a mais como lembrança da capital.
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Adenuzia Ferreira, de 42 anos, é uma das artesãs e bordadeiras da praça, que trabalha com o bordado livre. Foi apresentada a esse nicho de arte através de uma amiga, quando passava por uma fase difícil em sua vida. No entanto, a força motriz partiu de um sonho.

Trabalho característico do local, as bonecas são figuras que adornam várias barracas (Foto: Guilherme Honório)
Os processos de um sonho
Antes de dedicar-se ao bordado, Adenuzia concluiu um curso de enfermagem, mas não chegou a atuar na área. Como resquício dessa fase, permaneceu a paixão pelo corpo humano, refletido no seu trabalho.
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Até que um sonho veio para norteá-la. Nele, a artesã conta que vislumbrou seu quarto rodeado pelo bordado livre, com desenhos referentes a anatomia humana. “É isso o que eu quero”, disse, ao acordar. Pronto. Começava aí o caminho rumo à realização.
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São infinitas as opções usadas no processo de fabricação. Ela destaca a liberdade criativa da técnica. Depois, é só concretizar as pretensões imaginadas nos bastidores – objeto circular, onde o tecido é colocado e, com o auxílio de linha e agulha, o desenho é feito.
Anteriormente, até 2005, Adenuzia e outros artesãos ocupavam o Cheiro da Terra, localizado no bairro da Jatiúca. O espaço era bastante procurado pelos turistas e, na época, era o maior centro de artesanato de Alagoas. Naquele ano, um incêndio de grandes proporções atingiu o local, destruindo-o completamente. Na ocasião, a suspeita recaiu sobre o dono, que tinha a intenção de ceder o espaço para a construção de um prédio. Todavia, os trabalhadores não iriam receber qualquer tipo de recompensa, visando a realocação, e rechaçaram a ideia. Sem acordo, o homem teria cometido o crime propositalmente.

Numa cidade litorânea, as cadeiras compõem os trabalhos de Adenuzia (Foto: Guilherme Honório).
Logo após, foram remanejados ao terreno onde funciona o Unicompra da Ponta Verde atualmente. Lá, passaram por muitas dificuldades com a estrutura inadequada para o trabalho. Devido ao futuro supermercado que iria ser erguido, tiveram que ser novamente realocados. Agora, o destino era o bairro do Jaraguá. O espaço favoreceu por conta do fluxo intenso de turistas que visitavam o bairro histórico, além da facilidade de acesso – localizado numa das principais vias da cidade, a Avenida da Paz. Contudo, o local, atualmente o Memorial da República, pertencia à Marinha do Brasil. Resultado: expulsos pela armada.
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Os nômades do artesanato tiveram que fincar seus produtos na Praça Sinimbu, no centro de Maceió. Apesar de estarem próximos ao comércio, em nada foram favorecidos. Primeiro, por conta da falta de segurança da área. Segundo, pela escassa procura dos viajantes vindos de outros estados.
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Até que, em 2014, o grupo de artesãos fixou-se na Praça Lions temporariamente. Naquele momento, a área passava por uma renovação, durante a gestão do prefeito Rui Palmeira. Passado um tempo, conseguiram ocupar de forma definitiva o espaço.
Atualmente, segundo Adenuzia, há um outro projeto de revitalização em curso, entre uma construtora e a prefeitura de Maceió, que incluiria uma oficina de artesanato aberta ao público, espaço pet, academia ao ar livre e uma horta. As obras, no momento, estão atrasadas. Apesar desses empecilhos, o fluxo no local, às margens da rua Jangadeiros Alagoanos, favorece as visitações, principalmente aos domingos, dia de intensa movimentação na orla da praia, que fica a poucos metros, e no Pavilhão do Artesanato, em frente à Praça Lions. Vale destacar que os Guerreiros das Artes são os únicos em toda Alagoas a terem um espaço fixo para comercialização dos seus produtos. Na praça, eles pagam ao município a ocupação de solo.
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Trabalho característico do local (Foto: Guilherme Honório)
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Bordatomia
As criações da artesã carregam consigo aspectos intimistas, a partir das próprias vivências. Em um dos quadros, é possível ver o desenho com a frase “Se cuida sempre”, no qual um corpo feminino apalpa um dos seios, envolto por pequenas flores. Há um forte significado familiar. Tempos atrás, sua irmã foi diagnosticada com câncer de mama. Com auxílio do bordado, todas as dores foram superadas, esvaindo-se no compasso da linha e agulha que, mais tarde, deram forma ao desenho.
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Em outro – que poderia ser encaixado, perfeitamente, em uma obra do realismo mágico de Gabriel García Márquez – os sentidos aguçaram a criação. Nele, o canal auditivo divide a tela com elementos da natureza. Adenuzia percebeu que era uma de suas obras-primas, quando uma cliente, com problemas auditivos, elogiou o bordado. “Eu consigo, através da minha arte, tocar alguém. Então, isso, pra mim, é muito gratificante”, destacou a artesã, emocionada.
Bordado que simboliza o projeto de Adenuzia, onde a paixão pela anatomia foi projetada nos bastidores (Foto: Guilherme Honório)